Lendas
Escoteiras.
A
Lobinha Laninha e o mistério dos sinos da Igreja Matriz.
Não sei se vão
acreditar. Dizem que eu invento muito. Mas ei juro pela alma dos dirigentes da
UEB que é verdade. Risos. Eu estive lá. Acreditem se quiserem. Há muitos anos
eu conheci uma cidade no interior do sertão de Pernambuco. Nem sei como fui ali
parar. Não foi pela minha empresa, acho que foi um golpe do destino, pois
deveria ter ido a Sertânia e fui parar em Terra Santa. Pequena, menos de dez
mil almas. Nem hotel tinha. Fiquei na Pensão das Esmeraldas de Dona Eufrásia.
Para dizer a verdade a melhor cozinha que tinha conhecido. Almoço ou jantar era
um manjar dos deuses. Acho que foi por causa dela e de Laninha que fiquei por cinco
dias em uma cidade onde não tinha nada. Não tinha cinema, TV e as luzes da cidade
eram desligadas a onze da noite, comentam que foi lá que Judas perdeu as botas.
Na primeira noite alguns hóspedes conversavam sobre a lenda dos Sinos.
Inteirei-me de tudo. Todas as noites de lua cheia os sinos da Matriz tocavam um
melodia desconhecida. Muitos estavam ali como turistas. A fama dos sinos ganhou
mundo. No dia seguinte seria lua cheia e eles e outros milhares iriam chegar
para ouvir e ver os sinos tocarem.
Não sou cético e nem tampouco
um fanático por lendas. Dona Eufrásia me contou que desde a morte da Lobinha
Laninha no ano passado o sino tocava a meia noite nas noites de lua cheia. –
Lobinha? Perguntei. – Sim ela respondeu. Aqui tínhamos um Grupo Escoteiro.
Melchior um rapaz dos seus vinte e oito anos um dia chegou à cidade e comprou a
Farmácia do Beraldo. Junto estava a filha de quatro anos. Sozinho sem a esposa.
Dizia ser viúvo. Durante mais de três anos se tornou uma figura conhecida e bem
quista por todos. Sempre contava “causos” de quando foi Escoteiro. Melanino o
Prefeito o incentivou a organizar um Grupo na cidade. A Prefeitura daria uma
verba. Melchior animou-se. Pediu o padre que convidasse pais interessados a
colaborarem. No dia marcado mais de oitenta pais. A maioria mães. O primeiro
passo foi dado. Quatro meses depois os primeiros escoteiros e os primeiros
lobinhos.
Era um sucesso o
Grupo Escoteiro da Cidade. Por votação ele se chamava Grupo Escoteiro Coronel
Tibúrcio Belarmino em homenagem ao fundador da cidade. Melchior era o Chefe do
Grupo. A diretoria ativa. Mariazinha uma professora assumiu como akelá e com
mais duas assistentes tinha uma alcatéia linda e os lobinhos amavam sua Chefe.
Claro que Laninha foi uma das primeiras inscritas. Durante dois anos o Grupo
Escoteiro fez história. Chegou a ter em suas fileiras quinhentos participantes.
Um dia alguém veio correndo dizer que Laninha caíra da torre da igreja. Contava
antes de morrer que queria ver o sino tocar. Ele estava estragado e há mais de
dois anos não tocava. Segurou na corda perdeu o equilíbrio e caiu de uma altura
de trinta e seis metros. No seu funeral a cidade em peso presente. Um Sênior
tocou no seu clarim o toque de silêncio. Todos choravam. Mais ainda a Akelá
Mariazinha. Ela estava inconformada.
Laninha era uma menina muito amada por todos.
O Grupo Escoteiro Coronel
Torres Belarmino sofreu um choque com o acontecido. Muitos saindo. Chefes
desistindo. Um ano depois o grupo fechou. Em uma noite de lua cheia para
espanto da população o sino começou a bater e a tocar. Era uma musica suave,
mas ninguém sabia o que era. Resolvi ficar ver e ouvir o tal sino. Pedi
autorização ao Padre para subir até a torre e ver como um sino tocaria sozinho.
Onze horas da noite eu fui subindo devagar as escadas até o topo. Cheguei e
sentei em um banquinho. Acendi meu legítimo cachimbo Irlandês e deglutindo
aquele “blend” infernal esperei. Onze e cinquenta e cinco e vi um vulto.
Primeiro uma nuvem branca e nela uma menina vestida com seu uniforme de
lobinha. Linda. Sorria. Nem olhou para mim. Não me deu uma palavra. Levantou os
dois bracinhos e como se fosse uma grande Maestra o sino começou a tocar.
Prestei atenção na música. Reconheci logo. Era a sonata de Schubert, (Franz
Peter Schubert) “Sinfonia Incompleta”. Maravilhoso! Estava embasbacado.
A menina sorria. Que sorriso
maravilhoso! Tentei falar com ela. Nada. Ela estava como se vivesse o seu
momento para aquela musica e eu francamente não entedia o seu amor por ela.
Alí, no sertão de Pernambuco quem poderia gostar de Schubert? Cinco minutos
depois a musica terminou. Agora era outra. Também conhecida. Agora tocava bem
baixinho nada mais nada menos que a “Canção da Promessa”. Fechei os olhos e vi
a força daquela orquestra sinfônica. Ela regia como se tivesse feito aquilo a
vida inteira. Meu Deus! Qual o mistério? Nunca soube. Tentei conversar com o Padre.
Ele nada. Tentei falar com o Chefe Melchior. Ele não acreditou em mim. Na
cidade ninguém acreditou no que eu dizia.
Dona Eufrásia sorriu. – Olhe, vou
lhe contar. Ninguém sabe e alguns não querem saber. Não querem acabar com este
encantamento. A cidade todos os meses depende dos turistas que chegam. Chefe
Melchior era violinista da Orquestra Sinfônica de Pernambuco. Quando sua esposa
morreu vitima de Poliomielite ele desesperado veio parar aqui. De farmácia não
entende patavina. Nunca mais pegou em um violino. Sua filha o admirava quando
ele tocava. Quem sabe ela agora procura nos céu uma maneira de ouvir o pai?
Coisas misteriosas e uma charada impossível de ser desvendadas. Enigmas que
ninguém quer saber. Preferem o impossível. Não sou bom nisto. Alí em Terra Santa eu tinha
certeza que ninguém entenderia. Dona Eufrásia me olhou com um olhar “treteiro”.
Meu amigo há mais mistérios entre o céu e a terra, do que toda a nossa vã
filosofia. Puxa! Dona Eufrásia uma velhinha dos seus setenta e tantos anos, cabelos
brancos é também versada em William Shakespeare?
Boa noite durmam sorrindo com os anjos
do Senhor!