No mundo dos sonhos com as fábulas escoteiras

No mundo dos sonhos com as fábulas escoteiras
A aventura está apenas começando

sexta-feira, 28 de setembro de 2012

“Sordado marvado, sai da carçada que lá vai porva!”



Lendas escoteiras.
“Sordado marvado, sai da carçada que lá vai porva!”

                        Conheci Margarida em uma jornada que eu e mais quatro seniores fazíamos quando resolvemos ir até Malacacheta, a convite do Chefe Mauricio que disse ter um grupo novo lá. Eu, Israel, Laerte, Romildo e Chiquinho éramos inseparáveis. A distância de nossa cidade e a dele não era grande. Acredito que uns duzentos e cinquenta quilômetros. Como saímos em uma sexta quase as três da tarde, resolvemos pernoitar próximo ao Riacho das Vertentes. Uma lua linda não montamos barraca. Íamos dormir sob as estrelas. Nossa sopinha Estava quase no ponto. Escurecia quando ele chegou. A pé. Magro, barbudo, uma fileira de dente todos cariados. Usava perneiras, pois era uma região espinhosa. Chapéu de couro. No ombro seu fuzil inseparável que ele chamava de Loló. Amarrado na barriga um enorme colt 45. Depois fiquei sabendo que em cada perna tinha um punhal escondido.

                      Posso me adentrá? Falou baixinho. Olhamos espantados. Ele sério. – Me chamo Margarida, dá para comer com vocês? – Claro eu disse. Ficamos de olho e atento no que ele ia fazer. Coragem? Nada disto, mas dizem que ficar alerta faz bem em toda e qualquer ocasião. Sentou tirou um prato sujo do seu bornal e Israel encheu. Comeu feito um danado. Não pediu mais. Só água. Tínhamos café no bule esquentando no canto do fogão tropeiro. Bebeu com gosto. – Falou pouco. Meu nome é Margarida, meu pai me deu. Nunca mudei. Por causa dele matei muita gente. Se me chamam sem rir, tudo bem se derem um risinho esquento o bucho dele. – Olhei para Israel e ele piscou. Queria rir. Meu Deus! Não deixe ele rir!

                     - Não precisam ficar com medo. Me trataram bem. Vou embora lá pelas três da manhã. Podem dormir tranquilos. Enrosquei em minha capa preta em volta do fogo. – Você nasceu onde? Perguntei. – Em Barra Dourada. Próximo a nascente do Paraopeba. Lembrei-me do rio. Cascalho imundo. Pobre do rio. Estragaram ele tentando achar um ouro que não tinha. Até hoje as máquinas estão lá sujando o rio. Chiquinho queria saber mais. – Matou quantos Senhor Margarida? – Não me chame de Senhor. Senhor é o Senhor seu pai! – Putz grila! Mas se quer saber matei mais de trinta. Muitos porque riram do meu nome. Maldita hora que meu pai me batizou. Queria uma menina e nasci macho. Agora não tenho onde ficar. A policia de captura sempre está atrás de mim.

                       Fiquei calado. Israel me olhava e piscava os olhos. Margarida desconfiou. - Porque esta piscação? Nada Margarida. Israel tem um defeito na pálpebra. – E que merda é esta de pálpebra? Danou-se! Custei para explicar. Já estava tremendo. Margarida passou boa parte da noite sentado. Eu não consegui dormir. Fingia que dormia. Às três da manhã juntou suas coisas, um bornal que devia levar suas balas, seu fuzil e já ia partir quando dei ele um farnel de biscoito de polvilho. Agradeceu, ficou em posição de sentido, gritou Sempre Alerta e partiu sem sorrir. Consegui cochilar até as seis. Ouvi um tropel de cavalos. Cinco soldados e um Capitão. Deviam ser da tal policia de captura.

                       Ninguém apeou. O Capitão perguntou – Viram um jagunço magro, barbudo, armado até os dentes por estas bandas? E agora José? O Escoteiro tem uma só palavra falar o que? – Não Senhor. Chegamos aqui às duas da manhã. Só deu para fazer uma sopinha um café e já íamos partir. – Vão para onde? Malacacheta Senhor Capitão. Fazer o que lá? Um Chefe Escoteiro nos convidou. Nos olhou como quem não acredita. Deu até logo e partiu. Pegamos as bicicletas, arrumamos tudo e quando íamos partir um barulho no bosque e surgiu Margarida. – Ainda bem que não disseram nada, falou. Estava com a Loló (fuzil) armada e se dissesse que me viram iam levar uns tiros no rabo!

                     Foi embora cantando. “Sordado marvado, sai da carçada que lá vai porva!”. Resolvemos voltar para nossa cidade. O Chefe Mauricio que nos desculpasse. Para dizer a verdade estava com as calças toda molhada e outros com elas borradas. Não dava mais para prosseguir. Nunca mais ouvimos falar de Margarida. Do capitão não. Era famoso. Quando a cadeia estava cheia, pegava uns ladrõezinhos de fancaria colocava em fila e saiam pela cidade e fazendo eles gritarem – Roubei galinha! Roubei o porquinho da dona Noêmia. Depois soltava. Pois é. Meu escotismo tem muitas histórias. Diferente de hoje, mas sei que tem muitos que ainda fazem belas aventuras. E viva o Margarida se já não morreu!    

quarta-feira, 26 de setembro de 2012

A maldição do Lobo Vermelho.



Lendas escoteiras
A maldição do Lobo Vermelho.

                        Juraram-me de pé junto que era uma lenda. O povo gostava de contar histórias e inventavam muito. Eu pensava de maneira diferente. Lembrei quando nas eternas competições do passado quando no Quebra Coco nos fogos de conselho, tinha uma quadrinha que gostava de dizer: Minha mãe chamava Caca, e meu pai Caco Maria. Juntando Caco com Caco eu sou filho da Cacaria! Portanto, se o Cacique Boitiguara me contou eu não podia duvidar. Tinha passado para os pioneiros e acampava sempre nas planícies do Vale do Rio Doce lá para os lados de São Mateus e Nanuque. Já conhecia a tribo dos Machacalis, ou melhor, Pataxós como dizem hoje, e me tornei amigo do Cacique e de muitos outros índios da tribo.

                       Eram uma tribo sofrida, lutavam para sobreviver, mas com uma fraternidade que superava algumas vezes a tão falada fraternidade escoteira. Quando você fazia amigos na tribo podia-se saber que eram amigos de verdade. Eirapuã, Piatã e Potira três jovens da tribo, sempre me acompanhavam quando ia ali acampar principalmente na Garganta Montanhosa do Vale do Castanheiro.  Boitiguara o Cacique na última vez que lá estive ficou horas e horas na beira do fogo junto com outros “bravos” me contando a maldição do Lobo Vermelho, uma narrativa que ele com seus gestos contava como se estivesse vivendo a personagem do "Velho" Pajé Porã (aquele que possui beleza) que ouviu de seus ancestrais esta lenda que nunca será esquecida pela tribo enquanto ela existir.

                      Minha vida de Escoteiro nunca me deixava duvidar de um índio, pois não havia motivo para mentiras entre eles. Acampei ali muitas vezes, atravessamos o Rio Doce na curva do Cavalo Doido, mergulhamos na cachoeira do Macaco e quantas e quantas vezes eu Eirapuã, Piatã e Potira subimos a montanha do Lobo Vermelho sempre à luz do sol. Eles eram proibidos de passar a noite lá. Desta vez, que o "Velho" cacique Boitiguara me desculpasse, mas pretendia aproveitar uma bela lua cheia para ir ao cume e ver toda a majestade do Rio Doce, desde Crenaque até próximo a Aimorés. Era uma visão dos Deuses e eu precisava ver.

                       Foi Porã, o pajé meu amigo que me contou a lenda nos seus detalhes. Há muitas e muitas luas que passaram, havia um amor enorme entre dois jovens da tribo, cujos pais eram inimigos de morte. Ninguém na tribo sabia explicar direito o ódio entre eles, mas quem visse a esposa de Nakian, a bela Poranga (beleza) iria entender o ódio dos dois. Nakian era pai de Kalin (bela jovem), uma jovem de deslumbrante beleza e Quaraçã (luz do sol) um jovem esbelto, forte, cuja coragem todos da tribo reconheciam desde que participou da caçada da onça parda nas selvas do Olho Negro, era filho de Mauá, e nunca eles pensaram que seus filhos pudessem se apaixonar. Fugiram um dia e só deram falta dois dias depois. A procura foi grande. Nunca o encontraram. Um ano depois qualquer bravo que se arriscasse na Montanha Cinzenta voltava correndo, pois um lobo enorme, vermelho, com uma loba de olhos de fogo matavam que se aproximasse principalmente em noite de lua cheia. A montanha mudou de nome. Passou-se a chamar a Montanha do Lobo Vermelho.

                      Do Clã só Israel topou ir comigo. Contei para ele a lenda e ele riu. Bitelô (meu apelido) você não quer que acredite não? Afinal quantas passamos juntos? Com minha mochila as costas e meu chapéu de três bicos lá fomos nós no trem rápido da Vitória Minas as oito da manhã. Descemos em Crenaque e partimos rumo a Montanha do lobo Vermelho. Nem passamos pela tribo. Não dava tempo. Era tarde e mais duas horas a noite ia chegar. Subimos já à noitinha. A lua ainda não havia despontado. Quase no topo vimos uma nascente e achamos boa para acampar. Montávamos a barraca de duas lonas e ouvi um uivo que me gelou as veias. Israel parou e ficou ao meu lado. Próximo à curva da Arvore Seca avistamos os dois lobos. Meu Deus! Enormes! Um deles saiam chispas de fogo nos olhos. Não nos atacaram.

                        Ficamos lá dois dias. O que aconteceu não vou contar aqui. Só sei que descemos no terceiro dia e fomos direto até a tribo. Boitiguara se assustou. Estavam na Montanha do Lobo Vermelho? Rimos. Claro Chefe. A tribo inteira veio saber como foi. Pedi licença e usei meu apito. No meio das árvores surgiu os dois lobos, agora não tanto ameaçadores, mas foram até Boitiguara e lamberam suas mãos e desapareceram nas matas próximas ao vale do Rio Doce. Nunca mais, e isto fiquei sabendo de Piatã e Potira, ninguém nunca mais teve medo de ir a Montanha do Lobo Vermelho. Uma lenda que correu o vale, nas fazendas e nas cidades próximas por muitos e muitos anos. Mas soube que todos riam quando souberam da história contada por dois escoteiros. Verdade ou não, até hoje dizem que os lobos da montanha ainda correm pelos picos, pelas encostas, sobem em árvores e seu uivo percorre centenas de quilômetros.  Verdade ou mentira prefiro não dizer. Quem quiser vá a Nanuque. Atravesse o Rio Doce e siga no rumo das Pedras Negras. Lá na aldeia dos índios pergunte ao novo cacique, pois Boitiguara não deve estar mais lá. Talvez quem sabe seu espirito está a correr junto aos lobos vermelhos na Montanha onde vivem. E Chefe, como foi à história? Quem sabe um dia volto aqui para contar.     

segunda-feira, 24 de setembro de 2012

Eu prometo, pela minha honra!



Orgulho de ser Escoteiro.
Eu prometo, pela minha honra!

           Que semana meu Deus! Minha cabeça a mil. Sonhava com o próximo sábado e ao mesmo tempo meu corpo tremia. De medo? Claro que não. O Chefe tinha dito que nós escoteiros não temos medo. Mas sinceramente? Eu tinha sim. Seria um dia que ficaria marcado na minha vida para sempre. Afinal era o dia da minha Promessa Escoteira. Flavio me disse que eu estava pronto. Flavio é meu monitor. Disse que a Corte de Honra aprovou. O Chefe Gildo me chamou na reunião e disse – Sábado que vem você fará sua promessa. Acha que está pronto? Fiquei em duvida na hora. Sim Chefe. Eu estou pronto. Você conhece a Lei dos Escoteiros? Conheço Chefe, ainda não sei de cor, mas prometo que no sábado o Senhor pode perguntar. Direi todas.

           Passei a semana lendo, decorando, pensando e amando o que eu estava fazendo. Amava mesmo o escotismo. Na sexta fui para a pracinha do meu bairro. Ela era meu recanto favorito. Lá eu pensava em mim, na minha mãe, no meu pai e na minha Irmã Constance. Era o meu refugio. Agora estava voltando ao passado. Quatro meses antes. Eu os vi passando na minha rua. Fui atrás. Vi onde se reuniam. Adorei. Amei. Tinha de ser mais um. Minha mãe demorou a dizer sim. Meu pai trabalhava longe. O Chefe entendeu. Fui apresentado. Flavio me apresentou a Patrulha Leão. Todos me deram a mão esquerda. Não sabia o que era, mas nunca mais esqueci este dia.
    
           Não parava de dizer na minha mente, não podia esquecer agora e nunca mais. “Prometo, pela minha honra, fazer o melhor possível para...”, e a Lei? Difícil. Muito difícil para entender tudo, mas eu consegui. Saber que tinha de ser leal, ter uma só palavra, ser amigo de todos, irmão dos demais, ser puro nos meus pensamentos. Que lei! Mas ia prometer que faria tudo para obedecê-la. Meu uniforme estava pronto. Não sei quantas vezes o vesti alí no quarto e me olhava no espelho. Gostava do que via. Estava perfeito! Seria um orgulho de mim mesmo!

           O sábado chegou. Tomei um banho pensando. Era meu dia. O mais lindo dia da minha vida. No meu quarto coloquei peça por peça. Bem passado. Meu chapéu perfeito! Ensinaram-me as dobras do meião. Era a primeira vez. Na tropa só podíamos vestir o uniforme a partir da promessa. Lá fui eu rumo à sede. Assoviava baixinho. “De BP trago o espírito, sempre na mente!” Adorava esta canção. A turma estava lá, patrulhas em seus cantos. Sempre Alerta meus irmãos! Abraços. Era assim nossa Patrulha. O apito do Chefe. Bandeira! Ferradura! As bandeiras tremularam ao vento! Subiram aos céus dos escoteiros! Uma oração. Eu a fiz. Meus olhos cheios de lágrimas.

            Chefe! Tenho um patrulheiro para a promessa! Traga-o Marcio. Lá fui eu a frente com o Marcio. – Marley! Você está preparado? Sim Chefe! Meu corpo tremia. – Sabe a lei Escoteira e entende o seu significado? Sim Chefe, e sem ele esperar falei uma por uma. Todos assustaram. Nunca ninguém disse assim. A tropa Escoteira está de acordo com a promessa do Marley? Todos gritaram sim. Levante a mão direita, faça a meia saudação e repita comigo. Interrompi o Chefe. Poderia eu dizê-la sozinho por completo Chefe? Claro. – Estava ali, orgulhoso e agora não mais tremia – “Prometo, pela minha honra, fazer o melhor possível para: - Cumprir o meu Dever para com Deus e minha pátria, ajudar o próximo em toda e qualquer ocasião e obedecer à lei do Escoteiro”!

              Que dia meu Deus! Incrível! Meu lenço foi colocado, meu querido distinto de promessa que seria meu para sempre! Um certificado que mandei encadernar. Agora era um Escoteiro. Orgulhoso! Para sempre teria aquele dia na memória. O grito de Patrulha foi dado, abracei a todos com carinho, a tropa deu o Anrê. Que tarde linda, que beleza de vida! Como eu era feliz! Ser Escoteiro para sempre eu dizia para mim. Minha mãe apareceu, não sabia. A Mana também. Choravam de emoção.
Dizer mais o que? Foi o meu dia, um dia que jamais em toda minha vida esquecerei! Orgulho de ser Escoteiro! Claro, para sempre!             

domingo, 23 de setembro de 2012

Meu Amigo Fantasma, sua corneta, Zé Botina e muitas outras lambanças.



Boas lambanças de um passado distante.
Meu Amigo Fantasma, sua corneta, Zé Botina e muitas outras lambanças.

                Eu já disse e repito lambanças todo mundo tem. Alguns guardam para si, outros comentam em uma rodada de shope e eu gosto de contar aqui. Afinal hoje só posso fazer isto. Foram-se os dias de aventuras por este mundo afora. Agora vivo de lembranças e das lambanças que escrevo. Sei que tem muitos que não gostam e não acreditam. Paciência. Tem hora que eu mesmo tenho dúvidas. Risos. Já contei aqui várias. Algumas engraçadas outras não. Se não querem contar as suas me deixe com as minhas. Mais duas em duas épocas diferentes. Vamos a elas:

Primeira – 1961 – Mello Viana município de Coronel Fabriciano – MG – Eu o Chefe Carlos fundamos um Grupo Escoteiro. O Tapajós. Existente até hoje em Fabriciano. Carlos era da minha idade, dezenove anos. Conhecemo-nos na Usiminas onde trabalhávamos. Ele de Juiz de Fora, escola de Darcy Malta, um dos melhores escotistas que conheci. Resolvemos alugar uma casinha em Mello Viana. Uma república, (ainda solteiro na época) com mais dois ex-escoteiros. O Arlindo e o Mauro. O padre da paróquia se entusiasmou. O grupo começou com grande participação da comunidade. Conseguimos quatro barracões da prefeitura sem utilização próxima ao cemitério. Um dos lobinhos, um dos escoteiros, um dos sêniores e um da diretoria e almoxarifado geral. Em frente um campo de futebol. Melhor não acharíamos. Uma tarde jogávamos futebol só os chefes. Arlindo levou uma bolada no estomago e levado ao hospital morreu no dia seguinte vitima de hemorragia interna. Tinha tuberculose avançada. Não sabíamos.
Foi uma verdadeira epopeia levar o corpo na cidade de Manhumirim onde sua família residia. História que contarei proximamente. Uma semana depois começaram a nos dizer que uma noite sim e outras não, muitos instrumentos da fanfarra tocavam altas horas da noite na sede. Uma semana duas e na quarta depois de tantas reclamações, resolvi passar uma noite lá. Olhe, não sou corajoso, nada disto. Sou medroso sim. Mas mesmo molhando as calças não deixava um desafio para trás. Carlos se recusou a ir. Se fosse o Arlindo ele queria distância. Acho que foi a dentadura dele em cima do guarda roupa. Outra história. Onze da noite lá fui eu. Sozinho. Passei pelo cemitério e comecei a tremer. Abri a porta e entrei tremendo. Senti escorrer um liquido em minhas pernas. As luzes não acendiam. Tudo escuro. Um barulho tremendo de uma corneta no meu ouvido. Saí pela porta em disparada. Nem olhei para trás. Só parei na igreja. Calças totalmente molhada. O padre ainda acordado me perguntou – O Que houve Chefe Osvaldo? O Arlindo! – Mas ele morreu! – Pode ser que sim, mas o danado está na sede tocando corneta! O padre riu. Impossível! Só se for alma do outro mundo. Fomos para o interior da igreja. Rezamos juntos. Nunca mais fiquei sozinho na sede do grupo. Sempre de olho se ele não aparecia. Um ano para pararem de tocar a fanfarra na sede. Eu? À noite nunca mais!

Segunda – 1954 – Zé Botina tinha minha idade, treze anos. Não sei quantas brigas ouve entre nós dois. Pelo menos duas por semana. Não era Escoteiro. Tinha sua turma e quando me via sozinho eu virava um saco de pancadas. Eu revidava com duas ou três patrulhas quando o via só. Um dia vinha da sede quando vi uma grande confusão na Rua Peçanha. Encostei-me ao passeio junto a minha bicicleta. A polícia descia o sarrafo em uma turma e não sabia o motivo. Cassetete para todo lado. Zé Botina me viu e gritou! – Ele é da turma! – Maldito. Mesmo com treze anos virei um saco de pancadas dos policiais. Jurei vingança. Contei para os Lobos o que aconteceu. Uma noite Chiquinho chegou correndo. – “Bitelô” (meu apelido na época) Zé Botina vai para a sua casa sozinho. Seis valentes patrulheiros da Lobo lá foram correndo de bicicleta. Na descida do bairro Santa Terezinha o encurralamos. Tiramos sua roupa. Umas varadas no trazeiro que marcou. Pelado. Amarramos no poste da rua. O deixamos lá gritando. Cheguei em casa. Crise de consciência. Uma da manhã. Voltei lá. Tinha de ajudar. Não estava mais no poste. Voltei. Descendo a Rua Francisco de Assis, totalmente deserta lá estava Zé Botina com mais oito. Outra surra. Deixaram-me pelado na rua. Não me amarraram. Mas revidaram com as varadas. Escondendo aqui e ali cheguei em casa.
Os tempos passaram. Crescemos. As brigas nunca pararam. Mudei de cidade. Um dia no Porto de Tubarão em Vitória onde trabalhava, o Diretor me chamou. – Disse que precisava de um escriturário? Veja se este serve – A vida dá muitas voltas. Zé Botina em carne e osso. Ficamos amigos, acabou as brigas. Fui padrinho dele de casamento. O tempo passou. Nunca mais o vi. Soube que se alistou na Legião Estrangeira. Era seu sonho ser um legionário. Risos. Não sei se era verdade. Mas gostaria de vê-lo novamente. Saudades do Zé Botina!  

quarta-feira, 19 de setembro de 2012

A chuva.



A chuva.

      Ela chegou. Uma espera inolvidável. Quanta espera. Chegou agora. De mansinho, dizem que é das boas. Daquelas que chegam sem barulho. Duram horas, dias e tem casos de semana. Adoro a chuva. Não importa onde. Pode ser em casa, viajando de trem. Nem posso falar. Pela janela do trem ver a chuva cair é um espetáculo inesquecível. Alí vai ele, o trem. A correr pelas campinas sempre ao lado de um rio caudaloso ou não e a chuva cai. Que saudades!

      Estava na varanda, pensando no vento que soprava. Devagar. Calmo. E eis que ela chega. Trás uma gostosa brisa. Fresca. Espanta um pouco o calor de trinta e seis graus. Gostosa. Doce. Me lembrei de acampamentos. Quantos e quantos a chuva chegou. Às vezes brava. Gritante. Raios enormes e trovões que ribombavam o céu. Outras aquelas que não faziam barulho. Simples. Calma como a dizer não se assuste Escoteiro. Só vim molhar a terra. Estava seca. Precisava de mim.

      Na barraca, ouvir os pingos na lona, é uma musica suave, gostosa, como um cantar da mamãe nas noites de chuva para me fazer dormir. Tempos que já se foram. As madrugadas, a chuva não para. Abrir a porta da barraca, sentir o cheiro da terra! O farfalhar das árvores, a floresta falando baixinho chove chuva. Maravilhoso! Chove chuva. Quantas melodias me vêm a memoria. Prefiro uma só. Saudades de tantas, deixa chover!

Chuva
O céu está fechado escuro me parece vai chover no meu jardim
Depois que você me deixou nunca mais choveu em mim
Como esquecer todas as noites que a gente se amava sem pensar
Não tinha luz fazia frio e a chuva nos molhava.

Chove chuva, chove vem lavar esta saudade.
Leva do meu peito as lembranças que me invadem
Chove chuva, chove vem lavar esta saudade.
Lava do meu peito as lembranças que me invadem
Por favor.

sábado, 15 de setembro de 2012

O grande amor da escoteira Nadya Romanov.



Lendas escoteiras.
O grande amor da escoteira Nadya Romanov.

            Nadya Romanov era Escoteira. Tinha quatorze anos e faria quinze no final do mês. Nadya Romanov era linda. Alta para sua idade, corpo bem feito, cabelos encaracolados de um castanho avermelhado. Sua pele alva e sua face rosada, olhos verdes como se fossem duas turmalinas, completavam a beleza que irradiava para todos seus amigos ou não. Nadya Romanov amava o escotismo. Com paixão. Só falava nele em todos os lugares aonde ia. Nadya Romanov era excelente aluna. Sempre a primeira da classe. Sua Chefe Marlúcia Javiere tinha uma afinidade grande com ela. Quem sabe pelo seu esforço pessoal, pois era de família humilde e seu pai e sua mãe faleceram quando nasceu. Foi criada pela Avó Dona Cataryna Romanov, cuja pensão do marido era mínima.
           
           Nadya Romanov foi à primeira Escoteira a conseguir o Lis de Ouro em sua tropa. Fora lobinha Cruzeiro do Sul e há um ano eleita monitora da Patrulha Touro. Suas patrulheiras tinham grande simpatia por Nadya Romanov. Todos diziam que um dia ela seria uma das melhores chefes que o Grupo Já teve. Nos acampamentos e excursões estava sempre se movimentando ou ajudando onde sentia que podia completar a tarefa. Mas este mundo não é feito só de alegrias. Dizem que nada é para sempre. As coisas acontecem com qualquer um e Nadya Romanov não escapou das teias do destino que devia fazer parte da sua vida.

          Nadya Romanov estava apaixonada. Nunca pensou que pudesse acontecer. Um amor louco, uma paixão enorme por alguém mais velho que ela. Andrey Kobilya vinte anos. Aconteceu ao acaso. Andrey Cobilya vinha a toda pela rua em seu conversível amarelo ouro quando Nadya Romanov atravessou a rua. O sinal aberto para ela. Quase foi atropelada. Ele desceu do carro e queria levá-la ao hospital. Andrey Cobilya era um cavalheiro. Impressionava todas as mulheres pelo seu porte, seu rosto de Tom Cruise e seu sorriso encantador. A levou até sua casa, Nadya Romanov estava muda. Não conseguia falar. Seu coração não parava de bater. Seu corpo tremia Esqueceu-se de convidá-lo para entrar, mas ele a levou até a sala. Sua Avó ficou fã de Andrey Cobilya. Nadya Romanov esqueceu do escotismo.

          Saíram diversas vezes. O primeiro beijo aconteceu em uma noite de luar, próximo a praia da Areia dos Sonhos. Foi um beijo delicioso. Mexeu com tudo em seu corpo. Seus olhos fecharam e abriram novamente nas nuvens brancas do espaço sideral. Como se fosse uma carruagem puxada por dois cavalos brancos com crinas esvoaçantes ela e seu amor cumprimentaram a lua, um cometa que passou e as estrelas cintilantes no céu. No entanto, Andrey Cobilya era filho de um Capo da “Cosa Nostra”, para dizer a verdade ele era o “Capo di tutti capi”, ou seja, o Chefe dos chefes dentro da Máfia. O Senhor Nicolau Cobilya era conhecido. Dono de estradas de ferro, fábricas e diziam a boca pequena que era o maior chefão que a Máfia conhecera. Andrey Cobilya a levou a visitar seu pai. Ele beijou suas mãos. Elogiou. Falava rouco. Mexia com as mãos. Atrás dele sempre dois brutamontes que deviam ser seus capangas. Nadya Romanov teve medo. Já não frequentava mais os escoteiros. Seu coração pendeu para o outro lado.
 
           Seus irmãos escoteiros sentiram sua falta. A Chefe Marlúcia Javiere chorou muito ao saber da decisão de Nadya Romanov. Uma tarde um tiroteio em uma boate pôs fim à vida de Andrey Kobilya. Nadya Romanov tinha o coração partido. Mesmo sabendo que as dificuldades são enfrentadas pelo Escoteiro era difícil aguentar. Não sabia o que fazer. Só vivia em seu quarto. Chorando, pedindo a Deus que a levasse para junto do seu amor. O pior aconteceu. Nadya Romanov aos quinze anos estava grávida. Não sentiu pavor nem medo. Andrey Kobilya deixou para ela uma parte de sí. Iria amar seu filho para sempre. O Senhor Nicolau Cobilya queria levá-la para sua casa. Afinal era seu neto. O primeiro. Nadya Romanov não aceitou. Sua Avó apoiava em tudo. Voltou para o escotismo. Uma alegria geral de todos. Contou a cada um sua vida. Apoio total. Ivan Romanov Kobilya nasceu em 19 de novembro. Dia da Bandeira. Ivan Romanov Kobilya não perdia uma reunião da tropa Sênior/guia. Era amado por todos.

               Ela acostumou com os dois homens que dia e noite a protegiam e ao seu filho. Sabia que de uma forma ou outra estava ligada a Máfia. Não tinha jeito. Mas gostava sim de seu sogro. O Senhor Nicolau Cobilya era todo amor com o neto. Dava tudo que ele pedia. Foi com ela e ele percorrer o mundo. Ficaram muito tempo na Cicília, principalmente em Palermo. Ela conheceu muitos “padrinhos” que faziam parte de sua família.  Dizem que muitos anos depois, muitos anos mesmo Ivan Romanov Kobilya se tornou capo com a morte do Avô. Não sei bem o final da história. Sei que até hoje Nadya Romanov é Chefe Escoteira. Insígnia de Madeira. Seu filho cresceu como lobinho, foi Escoteiro Sênior e Pioneiro. Aqui a história termina. A máfia dominou o grupo? Não sei. Acho que não. Nadya Romanov já é Diretora Técnica e ama o escotismo mais que tudo. Sem imposições e sem donos. O distrito e a região tinham o maior respeito com ela. Pudera! Risos. Seu filho agora era o Capo dos “Capos”. Melhor calar e ir acampar. Com esta turma é melhor distância. Mochila as costas, bornal no pescoço, bandeiras ao vento e lá vamos nós! Xau capo dos capos! Risos.

sexta-feira, 14 de setembro de 2012

Nas terras bravias do Lago Dourado.



Nas terras bravias do Lago Dourado.

          Foi uma noite calma. As estrelas não cintilavam no céu como no dia anterior. Algumas nuvens brancas as cobriam como se fossem um manto protetor. A lua se fora há tempos. Achei que ia chover. Não choveu. Meus olhos estavam fechados. Dormitava pela madrugada fria. Um pequeno tronco me serviu como travesseiro. Coisas de um "Velho" mateiro acostumado. Um pequeno fogo ao lado agora só brasas com pequenas fagulhas que se inibiam ao subir aos céus me davam um pouquinho de calor. Pela aba do meu chapéu de três bicos eu podia ver a escuridão da noite. Gostava dela. À noite. Era minha amiga de muitas e muitas jornadas.

       Não ansiava pela madrugada. Que ela chegasse de mansinho. Não era um arbusto e quem sabe seria um pequeno arvoredo que encontrei perdido naquele vale dos sonhos era onde dormia. Serviu-me de manto para a noite gostosa daquele inverno que não fora tão rigoroso como os anteriores. Minha mochila ao lado era minha companheira de anos e anos de caminhada. Sempre fora. Dentro dela com carinho estavam minhas “bugigangas” de mais uma jornada. Meu bornal pendurado no galho guardava minha “matutagem” caso tivesse fome. Abri um olho de mansinho. Avistei uma cigarra azul que cantava baixinho seus cantos noturnos. Gosto das cigarras. Fazem-se de pródigas e só aparecem uma vez ao ano. E como são lindas. Amo-as! Muito!

         Senti uma brisa leve no rosto. Soprava gostosamente. Gostosa mesmo. Afagante. A brisa. Sempre perdida por aí. Nas montanhas, nos vales nos rios caudalosos ou no pequeno riacho de aguas turvas. Uma amiga. Não se esquece da gente. Os anos passam e lá está ela.  A madrugada não iria demorar. Grilos falantes pareciam fantasminhas na escuridão noturna. Melhor tentar dormir. Fora um dia e tanto. Uma grande jornada de um "Velho" Escoteiro sonhador. Um vagalume pousou no meu ombro. Sorri para ele. Enrosquei-me na Manta Negra que um dia a muitos e muitos anos meu Vô me deu com carinho. Não sentia frio. O corpo curtido pela idade já não era aquele de um passado que se foi.

         Um pequeno lusco fusco. Sinal que ela a madrugada ia chegar. Eu gostava das madrugadas. Eram lindas. Não importava se com sol ou com chuva. Adorava as madrugadas nos campos perdidos deste mundo de Deus. O cheiro da relva, das flores silvestres. O cheiro da terra. Ah! Maravilhoso! Tive madrugadas que marcaram. Com brumas a cobrir o campo verdejante, com brumas sobre os lagos azuis, cinzentos e vermelhos com o sol cobrindo-os. As brumas. Ah! Adoro-as. São lindas, querem cobrir meus olhos. Não querem que você veja ninguém só elas. Mas choram. Choram porque o sol irá chegar e elas terão que ir para longe, aonde ele o “Senhor Sol” ainda não chegou.

          Lá no horizonte um pequeno brilho. Pequeno mesmo. O sol. Ele estava chegando. Gostava de anunciar sua chegada. Era o rei. Não era um astro qualquer. Não aparecia assim do nada. Anunciava que se preparassem todos. Uma pequena claridade, um pequeno vermelho desbotado, raios brancos tingidos de amarelo ouro e eis que ele aparece. A montanha o reverencia. O dia nasceu. Eu estou acordado. Uma hora sagrada. Sempre gosto de ver o nascer do dia. É como se fosse uma criança chegando ao mundo. As brumas cinzentas me disseram adeus. O orvalho se escondeu. A última gota d’água caiu de uma folha adormecida. A brisa insistente continuava lá a me acariciar o rosto. Não se afastava. Uma amiga de épocas e épocas passadas.

          Hora de partir. Não disse adeus para todos eles que me acompanharam a noite e no lusco fusco da manhã. Não precisava. Eles sabiam que não era mais que um até logo, não era mais que um breve adeus. Eu voltaria. O "Velho" Escoteiro não para. Em sonhos ou pisante nos meus pés hoje cansados. Ajeitei meu lenço, arrumei meu meião. Calcei meu velho coturno de guerra. Mochila as costas, pendurei meu bornal no ombro. Minha forquilha de anos e anos e agradeci o arbusto que me serviu de lar e parti. Meu rumo? O mesmo de sempre. A busca da aventura. Sabia que em algum lugar iria encontrar o Lago Dourado. Diziam que não tinha peixes. Que uma bruma cinza o cobria por todo o tempo. Isto eu iria ver quando chegasse.

            O sol a pino. Gosto disto. Os primeiros pingos do suor caem e somem na estrada da vida que leva a rumos impossíveis. Meu chapéu de abas largas me protege. A forquilha me ajuda a andar e achar o caminho. Uma montanha verde, cheia de arvores lindas e floridas avisto ao longe. Deve estar perto a minha busca incessante. Quem sabe na virada da curva da Raposa que Chora eu encontro o Lago Dourado. Acordo. Era um sonho. Sempre sonho com este lago. Um dia irei encontrar. A cada dia em meus sonhos mais me aproximo. Levanto. Dou um sorriso. Um novo dia. Na janela o sol. Não há brumas. Até o lusco fusco da manhã se foi. A brisa está ali de leve de mansinho nunca deixou de me acariciar o rosto. Mais um dia iniciando. Ele vai passar como tantos que passaram. E quando a noite chegar vou dormir, vou sonhar e quem sabe um dia eu vou encontrar o Lago Dourado. Não vou desistir dos meus sonhos. Eles fazem parte de mim. A cada dia eu digo, não desista "Velho" Escoteiro. Digo sempre – “Eu voltarei”. Quem sabe um dia eu poderei dizer que encontrei o meu querido Lago Dourado? 

quarta-feira, 12 de setembro de 2012

O Chefe Pata Tenra, Os escoteiros chorões, o tatú-bola e a cascavel.



Lambanças. Quem não as tem?
O Chefe Pata Tenra, Os escoteiros chorões, o tatú-bola e a cascavel.

                 Lambanças fazem parte da vida. Ninguém passa pela vida sem passar por elas. Acontecem com qualquer um. Tive muitas lambanças na vida. Gosto de lembrar-me delas. São divertidas. Fazem-me bem. Cada passo cada jornada seja escoteiramente ou então na lida diária lá estão elas. Prontas para nos tirar do sério. Já contei aqui várias. Mais duas para ficarem na lembrança como verdade ou mentira. Acreditem se quiserem. Estas são duas simples. Nada espantoso. Risos. Não importa. Vamos lá:

- Primeira - 1979 - Acampamento de três tropas, grupos diferentes. Não era distrital. Chefes amigos acampando. Cinco dias. Local excelente. Seis chefes. Todas as tropas com quatro patrulhas completas, ou melhor, algumas com sete. Chegamos cedo. Dez horas. Combinado lanche para o almoço para dar tempo de montagem do campo. Dizem que é tipo Giwell, não sei. Me parece tipo Net. Não gosto. Acho que a Net debocha. Para não atrapalhar, não fizemos a inspeção da tarde. Cinco e meia já no lusco fusco chamada dos intendentes. Viveres para o jantar. Todos vieram. Simples. Um arroz, linguiça frita, batatas cozidas com chuchu. Seis e meia ouvimos as primeiras patrulhas dando o grito. Jantar pronto. Monitores nos procurando no campo de chefia nos convidando e dizendo que o jantar estava pronto. Claro, agradecemos. Fizemos nosso próprio jantar.

Oito horas da noite. Faltavam ainda quatro patrulhas. Todas de um só grupo. Melhor ir lá ver. Em cada campo só barracas montadas e muito mal armadas. Fogão? Necas! Escoteiros? Todos chorando em um canto de fome e medo e pedindo mamãe. Eureka! Só jovenzinhos de dez/onze anos. – Montei a tropa agora, disse o Chefe deles. Resolvemos nivelar a idade, assim todos teriam as mesmas condições. Não preparou os Monitores? - Eles me garantiram que dariam conta. Humm! Se tivéssemos celular naquela época o acampamento estaria cheio de mães para buscar os filhos. Eu e outro Chefe de outra tropa chamamos nossos Monitores. Ajudem. Façam o que puderem. Passem o comando para o submonitor. Tempo livre. Fazer atividade noturna só com todos. Os pata tenras não iriam aguentar. Em nenhum momento os chefes interferiram.

Dez e meia, os chorões jantando. Vieram todos de todas as patrulhas, abraços, ajuda, ensinando pioneiras. Montando campo. Onze e meia. Todos dormindo. Dia seguinte, um belo de um acampamento. Uma amizade sem fim. Os Pata Tenras sorrindo. Adorando o acampamento. Ultimo dia, abraços, apertos de mão, choro, mas desta vez de saudades. O Chefe aprendeu. Virou IM. Anos depois foi dirigente da Região onde eu estava. Pois é. A vida nos ensina e dá muitas voltas. Quem o viu antes! Coisas da vida.

- Segunda – 1954 – Acampamento em Aguas Turvas. Dois dias. Só os Raposas. Chegamos sábado bem cedo. Nada de novo. Sabíamos o que fazer. Sete escoteiros. Três Primeira Classe e três segunda. Só eu de Pata Tenra. Duas horas da tarde. Tãozinho correndo – Vi um Tatu-Bola. Fumanchú vibrou. Daria um ótimo ensopado com batatas. Fumanchú era o máximo. O melhor cozinheiro que já vi. Lá fui eu o Romildo Monitor, o Israel Sub e o Tãozinho. Não era fácil pegar um tatu. Eles já pegaram antes. Buraco fundo. Enfiar a mão? Nunca como dizem pode ter uma cascavel. Vamos usar o truque da fumaça. Galhos secos na porta, fogo muitas folhas verdes molhadas. Uma fumaceira do inferno. É só fecha a porta do buraco. O tatu sai correndo. Dez minutos nada. Vinte. Chocalho de Cascavel. E agora? O tatu se enroscou. A cascavel não podia morder. Só vi o buraco sendo aberto pela cascavel.

Pernas para quem vos quer. Não estávamos preparados. Deixe para amanhã. Voltamos, matamos a cascavel e pegamos o tatu. O danado não escapa! Dormimos. Um bom Fogo de Conselho. Dei risadas, mas de vez em quando ouvia chocalho de cascavel. Os patrulheiros também ouviram. Melhor fazer um fogo alto em frente às duas barracas de duas lonas. Dormimos. Dia seguinte espreguiçando, saí da barraca. Putz Grila! Oito Cascavéis em volta. Dormiram ali esperando a gente acordar. Todos levantaram assustados. Romildo gritou! Por aqui. Corram o que puderem. Fomos para o lago. Ficamos lá até duas da tarde. Voltamos. Campo vazio. Desmontar acampamento. Vamos para a fazenda do Linhares.  Em fila partimos, chocalhos na mata atrás de nós. Saímos na Rio Bahia. Avistamos quatro delas na beira da estrada a nos espiar. Uma carona em um caminhão caçamba.

Nunca mais voltamos em Aguas Turvas. Não gosto de cascavéis até hoje. Sempre que vejo uma me dá arrepio. Uma mordida, quatro horas para morrer. Dependendo dela nem soro resolve. E naquela época soro? Melhor uma Surucucu. Não corre. Para e enfrenta. Se vai ela fica. Cascavel não. Corre atrás da gente. Enfim, quem já acampou já viu cobras. Sempre correndo da gente. Fazer barulho no mato e elas vat. Vup! Mas não confiem nunca em cascavéis! 

domingo, 9 de setembro de 2012

As exéquias do Bagre Limoeiro.



Saudades não tem idade.
As exéquias do Bagre Limoeiro.

        Sempre gostei de acampar sozinho. Estar lá em plena floresta ou um vale qualquer, sem barulho, sem conversas e claro sem desmerecer as inúmeras companhias de milhares de amigos em acampamentos por anos e anos, para mim sempre foi motivo de doce deleite. Quem já teve o privilegio de acampar sozinho deve saber como é. Ter a companhia dos pássaros, aprender com eles seu gorjear, ver suas moradas e sem barulho quando estão em bandos, seguir a pista de um quati, de um Tatu Canastra, fazer amizade com um Lobo Guará, e deitar próximo a uma cascata de um pequeno riacho para ouvir o som inigualável das águas borbulhantes, é simplesmente inesquecível. E a noite? Um espetáculo a parte. O som da floresta, dos noturnos habitantes com seu cantar alegre, quem sabe uma coruja de olhos grandes a olhar você como a dizer - O que vem fazer aqui no meu lar? E as estrelas. Ah! As estrelas. Ficar horas e horas vendo o movimento delas, ser surpreendido com um cometa azul que passa riscando os céus ou mesmo com o delicioso cair do orvalho, a molhar seu rosto de uma forma carinhosa e simpática.  

      Desde Sênior que fazia isto. Hoje não mais. Minhas pernas resolveram aposentar e minhas forças costumam me dar um adeus sem horas para voltar. Mas fiz muitos. Sempre a cada três ou quatro meses lá ia eu para os meus “cantos” de laser. Acho que o último deve ter sido há uns quatro anos atrás. Eu tinha ou acho que ainda tenho quatro locais lindos. Os meus preferidos. Achava melhor que ir desbravar locais inóspitos a não ser em boa companhia de bons acampadores. A Represa do Gavião era ideal. Uma bela mata, um bom gramado, muitos pés de bambus e peixes e o melhor de difícil acesso. E como tinha peixes meu Deus! Bastava levar um quilo de sal, uma meia lata de óleo, açúcar, café, um ou dois Bombril, um facão, uma faca (a minha que tenho desde os doze anos), uma machadinha, uma manta uma muda de roupa e mais nada. Se fizesse frio nada que um Fogo Espelho não resolvesse. E se chovesse deixe a chuva cair que faz bem e o cheiro da terra molhada é de deixar qualquer um inebriado. Aonde ia a comida era farta. Goiabas, jabuticabas, mamões verdes ou maduros, maxixes, maracujás, pés de taioba, de mandioca, batata doce e peixe. Uma quantidade imensa. Precisava de mais?

       Precisava voltar a Represa do Gavião. Na ultima vez que lá estive, pesquei um enorme bagre cinzento. Grande mesmo. Demorou para tirar do anzol. Foi então que ele olhou para mim e como a dizer o que ninguém entenderia, me pediu com aqueles olhos chorosos a devolvê-lo as águas da represa. Só faltou dizer que tinha mulher e filhos. Não sei, mas ele teve seu intento aceito de bom grado. Já tinha pego uma traíra que nada me pediu a não ser tentar dar uma mordida em minhas mãos. Ao colocar o bagre na água, ele sumiu no remanso escuro da noite. No dia seguinte à tarde fui pescar uns lambaris para a janta. Seria sopa de maxixe, mandioca e batata doce com pedaços suculentos de lambaris fritos. E não é que o danado do Bagre estava lá, a nadar e pular como a dizer: Obrigado, muito obrigado. Agora você é meu amigo. Estava com seis limões que tinha achado um pouco acima da represa próximo a cascata do Arco Iris e o apelidei de Bagre Limoeiro.

         No dia seguinte fui lá para cumprimentar o meu amigo Limoeiro. Ou melhor, o Bagre. Estava na beirada da represa, preso entre ramos e morto. Incrível! Ontem estava bem e hoje assim? O peguei e ele piscou os olhos pela última vez. Pensei que iria sentir falta dele quando ali voltasse. Resolvi enterrá-lo na beira da represa. Deixar para que outros peixes o comessem não seria certo. Um pequeno buraco, folhas diversas e o coloquei lá dizendo adeus. Fiquei triste e preocupado. Será que fui o culpado? Ele não tinha ficado tanto tempo fora da água. Mas fazer o que? À tardinha voltei ao meu local favorito de pesca e não é que lá estavam um enorme bagre e mais seis bagrinhos? Esposa e filhos do Bagre Limoeiro? Não sei, mas brincavam sem medo de mim na superfície da água.

         Eu sinto falta de muitas coisas que fiz no passado. Muitas mesmo. Falta dos bons acampamentos, dos bons desfiles, de minha corneta favorita, do meu bastão de guia, dos grandiosos Fogo de Conselho em varias partes do Brasil e algumas no exterior. Falta dos amigos que se foram, das caminhadas, das incríveis jornadas ciclísticas, dos deliciosos momentos de deleite quando ribombavam trovões e raios em um acampamento. Eram meus momentos favoritos. Adoro a chuva. Mas saudades mesmo eu sinto dos meus acampamentos a Escoteira (aquele que anda só). Dizem que saudades não tem idade e não são apenas lembranças. É como se estivéssemos lá fazendo tudo de novo. E eu com minhas saudades na minha cadeira favorita na varanda do meu lar, vendo o entardecer de um sol que já se foi só tenho a agradecer a Deus pelos momentos felizes que passei no Movimento Escoteiro. Belos momentos a sós junto à natureza. Acho que valeu e se valeu eim?

sexta-feira, 7 de setembro de 2012

A simpática Viúva Dona Eufrásia Mercês Pimenta



Crônicas de um Chefe Escoteiro
A simpática Viúva Dona Eufrásia Mercês Pimenta

                       Há tempos que tínhamos ouvido falar das fantásticas quedas e corredeiras d’água na Serra do sol Poente. Falavam coisas lindas e sempre pensamos em ir lá. Mas o tempo foi passando e nada. Não era tão longe. Disseram-nos que mais ou menos 230 quilômetros. A estação da estrada de ferro ficava distante, e depois mais de 100 quilômetros. Podia até tentar levar as bicicletas no bagageiro do trem e de lá seguir nas bicicletas. Mas seria muito trabalhoso. Todas as quedas d’água e corredeiras diziam ficar nas terras da Viúva Dona Eufrásia Mercês Pimenta. Ninguém sabia dizer como ela era. Poderia ser simpática ou talvez não, pois poderíamos fazer uma viagem atoa caso ela negasse nossa entrada em suas terras.

                     Nossa Patrulha decidiu ir naquele julho de 1956. Onde morávamos o frio já tinha ido, o céu azul e o calor de mais de trinta graus mostravam que faríamos uma linda atividade. A Patrulha não foi completa. Chiquinho arrumou um emprego de ascensorista no novo prédio da telefônica e sair agora seria ruim para ele. Bem ainda restavam os cincos seniores da pesada que decidiram ir. Nosso plano era de dois dias de viagem nas bicicletas, ficar lá cinco dias e voltar. Nove dias total. Dois dias antes da partida deixamos tudo preparado e cada um levou seu material para colocar em suas bicicletas. Tínhamos vários bornais próprios que no bagageiro e no quadro levamos tudo além de nossas mochilas.

                   Na manhã de sábado lá fomos nós. O povo gostava de nos ver passar. As bandeirolas nas bicicletas chamavam a atenção e claro, sempre cantávamos a plenos pulmões quando fazíamos este tipo de atividade. Já nos conheciam. Pegamos a estrada que nos levaria a Nova Estância. Primeira parada. 120 quilômetros. Chegamos cedo. Passamos pela cidade e acampamentos na beira do Rio Paredes. No dia seguinte bem cedinho onde o sol ainda não tinha dado as caras e após um café do Fumanchú que era bom na cozinha lá fomos nós.

                  Ainda não eram cinco da tarde e começamos a subir uma montanha que não dava para pedalar. Empurrando subimos uma boa parte dela e avistamos uma placa que só poderia ser da Viúva Dona Eufrásia. – “Estância da Felicidade”. Bom saber disto. Se fosse verdade a viúva seria uma pessoa amável e não negaria nosso pedido para explorar e acampar naquelas terras de belas quedas e belas corredeiras. Eu mesmo já tinha feito plano de descer em uma numa jangada que iria construir. Adorava estas aventuras. Avistamos ao longe a casa da fazenda. Que beleza de casa! Linda! Parecia aquelas dos filmes mexicanos nos faroestes que assistíamos.

                Chegamos e avistamos na varanda uma mulher que só poderia ser ela. Alta, loira, magérrima, uma boca enorme com poucos dentes e cariados. Lembrei-me dos desenhos do Popeye. Era parecidíssima com a Olivia Palito! Mas falar o que ali? Precisávamos de autorização. Estávamos em terra estranha. Ela mandou subir. Vinte lances de escada até a varanda. Ao lado dela dois homens com cara de mau. Não nos apresentou. Depois ficamos sabendo que eram jagunços dela. Estranhei a mulher. Ela não tirava os olhos do Romildo. Era nosso Monitor. Não estávamos entendendo nada. Ela mandou sentar. Olhava para o Romildo como se fosse comê-lo vivo! – Voces podem ir passear onde quiserem. Este moço fica comigo!

               E agora? Fazer o que? Dona, disse o Fumanchú, ele é nosso líder. Sem ele não dá! – Ela nos olhou de cima em baixo, virou para um dos jagunços e disse – Leve-os até a saída da fazenda. Se não forem embora nada que uns tiros não resolvam. Meu Deus! Que enrascada era aquela? Todos nós tremíamos de medo. Romildo tremia mais ainda. Lá fomos nós sem o Romildo. Na porteira de saída os jagunços tiraram os revolveres. Saímos em disparada. Na curva paramos. O que fazer? Israel disse que devíamos esperar. Romildo a noite daria um jeito de fugir.  Assim fizemos duas da manhã, estávamos acordados a beira de um fogo e eis que ele chegou gritando – Montem! Pé na taboa! Os jagunços estão atrás de mim.

             Olhe levamos menos de um dia e meio para chegar em nossa cidade. Que aperto meu Deus! Romildo não quis contar nada. Com muito custo contou uma parte. A Viúva disse que gostou dele. Não iria mais deixá-lo ir embora. Só morto! Mesmo ele dizendo que era menor de idade, tinha família e nada. Levou ele para o quarto. Romildo não contou o que aconteceu lá. A gente imaginava. Conseguiu se mandar quando ela roncava e como roncava. Pena que nossa atividade deu em nada. Para não perder tudo que preparamos fomos até Derribadinha. Lá podíamos acampar a vontade nas Terras do Seu Machado.

             Um dia quando crescer em volto lá. Disse o Romildo. Irei com voces. Seremos seis homens feitos. Não posso ficar sem visitar aquelas terras cheias de cachoeiras e corredeiras! Pensei comigo. Ele vai sozinho nessa eu não entro mais e garanto que ninguém da Patrulha vai! Mas fiquei em duvida. Duvida mesmo. Ou será que Romildo gostou da Viúva Eufrásia Mercês Pimenta? Ninguém nunca ficou sabendo. Sei que ele casou com Marilda uma linda morena do bairro dos Pimentas! Risos. Nada disto. Nada a ver com a viúva! E depois não me digam que isto não são coisas de escoteiros? Risos.

quarta-feira, 5 de setembro de 2012

O Lobinho Naldinho e a terrível Casa do Espanto.



Lendas escoteiras
(uma historia para ser contada aos lobinhos/as)
O Lobinho Naldinho e a terrível Casa do Espanto.

                Naldinho estava na janela olhando de soslaio para que ninguém o visse da casa em frente a sua. Já havia seis dias que ele fazia isto. Sua mãe e seu pai achavam que ele estava dormindo. Dormia cedo. As nove já subia para o seu quarto. Mas desde o dia que foi fechar a janela por causa de um vento súbito ele viu três formas pessoas em forma de fumaça descer pela chaminé da casa vizinha. Naldinho tinha nove anos. Era lobinho da matilha verde. Já tinha dois anos de lobinho. Todos gostavam dele. Há um ano era o primo da matilha. Conseguira a Primeira Estrela e pensava que até o fim do ano receberia a segunda estrela. Sabia que pelas onze ou onze e meia às assombrações iriam aparecer. Todos os dias era assim.
             
Naldinho lembrava quando ao chegar da escola não viu a placa na casa que fora de Dona Matilde. Seu Geraldo morrera e ela resolveu ir embora morar com a filha. Colocou a casa a venda. Naldinho ao beijar a mãe perguntou quem era os novos vizinhos. Sua mãe disse que não viu ninguém. Não houve mudança. Durante muitos dias a casa ficou fechada até que na noite fatídica Naldinho viu as aparições entrarem pela chaminé. Logo notou que havia barulho e janelas fechavam e batiam. Luzes da cor violeta e roxa toda hora piscavam na casa. Isto acontecia até altas madrugas. Naldinho não sabia quando terminavam. O sono chegava e ele ia dormir. No primeiro dia comentou com sua mãe. Ela como sempre disse que ele estava vendo muito filme de terror. Engano. Naldinho nunca viu nenhum.
             
Na reunião de sábado comentou com Princesa, a sua segunda (o nome dela era Paty) sobre o acontecido. Ela acreditou. Sapinho o terceiro da matilha também (Norberto). Eram os três que ficavam mais juntos, pois alem de serem da mesma matilha estavam na mesma classe na escola. Naldinho queria levá-los a ver a descida dos fantasmas noturnos, mas era impossível naquela hora. Nenhuma mãe deixaria eles ir lá. Uma semana tentou ver se as mães deixavam os dois dormir lá de uma sexta para um sábado. Deram uma desculpa de um trabalho para a matilha. Uma das mães perguntou a Mirtes, a Akelá e ela não se lembrava de nenhum trabalho. Deu em nada.
             
No sábado após a reunião, Naldinho propôs aos dois irem até a casa e tentar entrar. Sapinho tremeu e disse que tinha medo. Princesa apesar de ter duvida topou na hora. Nem bem a reunião terminou saíram correndo, pois se atrasassem na chegada em casa ia ser um Deus nos acuda! Procuram alguma janela aberta e com surpresa viram que todas estavam abertas e as portas também. Entraram. Sala vazia. Sem móveis. Cozinha nada. Subiram ao andar superior. Um cheiro de queimado. Um quarto. Nada, vazio. Segundo quarto uma surpresa. Cordas, velas, uma machadinha, um facão, potes cheios de uma coisa vermelha (seria sangue?) e muitos gravetos num canto. Assustaram-se.
            
No segundo quarto outra surpresa. Uma cama sem estrado. Um emaranhado de arame farpado fazia às vezes de colchão. O que era aquilo? O que significava? Sapinho começou a tremer e chorar baixinho. Pedia insistentemente para ir embora. Naldinho resolveu descer e ao chegar embaixo um barulhão. As janelas se fecharam automaticamente. As portas estavam trancadas. Tentaram abrir e nada. Meu Deus! E agora? Sentaram em um cantinho debaixo da escada e ficaram ali tremendo de medo. Viram as sombras aparecerem pela saída da chaminé. Sapinho chorava baixinho. Princesa de olhos arregalados. Naldinho achou que era o Chefe. Levantou-se e disse – Eu não tenho medo! Sou lobinho! O lobinho é forte! – As sombras riram. Pegaram os três e os levaram ao andar de cima onde em um quarto foram amarrados. Umas das sombras tomou vida. Um enorme tigre dentuço. – Você é o Shere Khan?
           
Não tinha jeito. As sombras iam fritá-los na fogueira. Pedir socorro não adiantava. Gritar também não. Mas Naldinho não desistiu. Fechou os olhos e pediu a Deus, a Jângal, aos seus irmãos lobos que não os deixassem morrer. Um clarão enorme aconteceu! Quase cegou os olhos dos três lobos. Quando abriram viram um enorme Urso, uma enorme Pantera a gritar para Shere Khan: - Você não desiste mesmo não é seu Tigre Manco! Vamos lhe dar uma lição. Shere Khan deu enormes gargalhadas e sumiu na fumaça. Bagheera a Pantera Negra os soltou. Baloo o urso grandalhão e amigo os aconselhou – Nunca façam o que sabem ser errado. Voces conhecem a Lei do Lobinho – “O Lobinho ouve sempre os velhos lobos”. E os dois também desapareceram.
          
Voltaram para suas casas. Ainda tremendo deram o “Melhor Possível” um para o outro se se foram. Naldinho aprendeu a lição. Nunca mais tomou iniciativa sem antes aconselhar com seus pais, sua professora, e seus chefes. Uma semana depois nova placa anunciava a venda da Casa do Espanto. Desta vez Naldinho não quis nem saber quem iria comprar, quem iria morar e dormia cedo. Muito cedo. As máximas da Jângal nunca mais seria esquecida. Naldinho agora andava de olhos e ouvidos bem abertos, nunca deixou de pensar primeiro nos outros, andar sempre limpo, dizer sempre a verdade, e claro, dar boas risadas de tudo pois o lobinho é como Akelá levando sua Alcatéia com alegria e sempre procurando o caminho para o sucesso de todos!               

TÔ VELHO (a)! QUE COISA BOA!



                 Recebi esta mensagem via e-mail. Interessante. Nem tudo sou eu, mas tudo pode ser eu. Resolvi compartilhar com meus amigos e minhas amigas que estão agora vivendo a nova etapa da terceira idade (sabe, eu me pergunto qual é idade de quem está na primeira e segunda idade. Risos).

TÔ VELHO (a)! QUE COISA BOA!

                 Eu nunca trocaria meus amigos surpreendentes, minha vida maravilhosa, minha amada família por menos cabelo branco ou uma barriga mais lisa. Enquanto fui envelhecendo, tornei-me mais amável para mim, e menos crítico de mim mesmo. Eu me tornei meu próprio amigo.
Eu não me censuro por comer biscoito extra, ou por não fazer a minha cama, ou pela compra de algo bobo que eu não precisava, como uma escultura de cimento, mas que parece tão “avant garde” no meu pátio. Eu tenho direito de ser desarrumado, de ser extravagante.
                Vi muitos amigos queridos deixarem este mundo cedo demais, antes de compreenderem a grande liberdade que vem com o envelhecimento.
Quem vai me censurar se resolvo ficar lendo ou jogar no computador até às quatro horas e dormir até meio-dia?
               Eu Dançarei ao som daqueles sucessos maravilhosos dos anos 60 & 70, e se eu, ao mesmo tempo, sentir desejo de chorar por um amor perdido... Eu vou. Vou andar na praia em um short excessivamente esticado sobre um corpo decadente, e mergulhar nas ondas com abandono, se eu quiser, apesar dos olhares penalizados dos outros. Eles, também, vão envelhecer.
Eu sei que eu sou às vezes esquecido. Mas há mais, algumas coisas na vida que devem ser esquecidas. Eu me recordo das coisas importantes.
Claro, ao longo dos anos meu coração foi quebrado.
            Como não quebrar seu coração quando você perde um ente querido, ou quando uma criança sofre, ou mesmo quando algum amado animal de estimação é atropelado por um carro?
Mas corações partidos são os que nos dão força, compreensão e compaixão. Um coração que nunca sofreu é imaculado e estéril e nunca conhecerá a alegria de ser imperfeito.

            Eu sou tão abençoado por ter vivido o suficiente para ter meus cabelos grisalhos, e ter os risos da juventude gravados para sempre em sulcos profundos em meu rosto. Muitos nunca riram, muitos morreram antes de seus cabelos virarem prata.
            Conforme você envelhece, é mais fácil ser positivo. Você se preocupa menos com o que os outros pensam. Eu não me questiono mais.
Eu ganhei o direito de estar errado.

             Assim, para responder sua pergunta, eu gosto de ser velho.
Ele me libertou. Eu gosto da pessoa que me tornei. Eu não vou viver para sempre, mas enquanto eu ainda estou aqui, eu não vou perder tempo lamentando o que poderia ter sido, ou me preocupar com o que será. E eu vou comer sobremesa todos os dias (se me apetecer).

Que nossa amizade nunca acabe porque vem direto do coração!