Conversa ao pé do fogo.
As aventuras de Léo, um Escoteiro.
“Este conto foi escrito pelo Chefe Kleber Svidzinski de Mogi Guaçu”.
Ele diz que esta foi uma história contada em um Fogo de Conselho por um
Escoteiro, que ele somente transcreveu. Para mim surge mais um escritor
Escoteiro para alegrar nossos corações em noites de Fogo do Conselho.
Léo
olhou o sol que já se apresentava alto no horizonte, o monitor consultou seu
relógio, era a terceira vez que o fazia, tinha tomado uma decisão errada. Claro
que sabia quem eram os elementos de sua patrulha, conhecia todos muito bem,
afinal em quase dois anos, desde que assumira o cargo da Patrulha Urutau já
tinham feito mais de 10 acampamentos juntos, sabia serem jovens de fibra,
verdadeiros escoteiros, conhecia suas qualidades e tinha também o respeito de
todos eles. Mas o que seria somente uma exploração noturna ao Pico do Cruzeiro
acabou se tornando um divertido pernoite. Sentia-se aliviado por todos terem
avisado seus pais sobre esta possibilidade, uma vez que já estavam acostumados
com este tipo de aventura, o único problema era não terem se prevenido melhor
na alimentação, haviam comido tudo que trouxeram para a aventura, estavam há
mais de 08 horas sem se alimentar e ainda iriam levar mais uma 4 horas até
chegar à zona urbana de sua cidade.
Nem
a estação havia ajudado, fosse em setembro encontrariam muitas gabirobas,
seriguelas, macaúbas, entre outras, mas não estava na época das frutas, as
árvores estavam todas floridas, o que pelo menos deixava o passeio com visual
mais alegre e colorido. A noite havia sido maravilhosa, o céu parecia que havia
sido pintado a mão dada à quantidade enorme de brilhantes estrelas. Até alguns
cometas deram o ar de sua graça. Nem o brilho da pequena fogueira conseguiu
inibir tamanho show de astros. As histórias, as lembranças, as canções, tudo
isso ajudou fazer as horas voarem, acreditava nem ter dormido, parece que havia
tido um simples cochilo... O despertar do sol, ainda mais maravilhoso do que a
noite que se apresentou a eles, o fez retornar a realidade. Também fez lembrar
que naquele local não havia sequer uma fonte de água potável. O pio de um
Carcará ao longe, trouxe-o de volta a realidade...
Mais
uma vez olhou seu relógio, apesar de ter repetido o mesmo gesto vários vezes
também tornou a verificar seu cantil... Seco. A boca seca já pedia um pouco de
água, e ele sabia que além da sede, a fome também já mostrava seus sinais. Deu
uma rápida olhada para trás, ficou mais aliviado, a patrulha conversava
alegremente, apesar do cansaço, da sede e da fome. A paisagem que se
apresentava amenizava estes sintomas e o espírito aventureiro de seus parceiros
deixava muito claro que os anos de movimento escoteiro tinha-os tornado jovens
diferenciados, capazes de enfrentar este tipo de dificuldade. Mas, em seu papel
de líder sabia não ter sido a decisão correta. Enxugou o suor da testa e
resolveu chamar Deco, seu sub-monitor. Este rapidamente deixou o final da fila
e se posicionou ao seu lado. O próprio Deco já havia lhe dito que havia sobrado
uma lata de leite condensado na mochila da patrulha.
Pediu
que a pegasse. Com certeza o doce ajudaria a restaurar um pouco das energias
perdidas, mesmo que isso aumentasse um pouco a sede. Retirou a fivela do cinto
escoteiro que entre outras utilidades também servia como abridor de latas e fez
dois pequenos furos nos extremos superior da latinha. Ao gesto seu, a patrulha
parou a caminhada e fez um semi círculo ao redor de seu líder. Ele explicou a
eles que ainda havia pelo menos mais 04 horas de caminhada, sabia que todos
estavam cansados e também com fome e sede, pediu mais uma vez desculpas por não
ter previsto que isto poderia acontecer e mostrou a todos a pequena lata de
doce, já aberta, pediu que cada um sorvesse um pouco do conteúdo e explicou que
isto os ajudaria a amenizar um pouco os efeitos da caminhada. Todos sorriram e
pareciam nem estar se importando muito com a situação, mas ele sabia muito bem
que todos não queriam demonstrar aos demais a real situação em que se
encontravam.
Então Leo
levou a lata aos lábios, fingiu estar degustando o precioso e caudaloso doce,
não engoliu uma gota sequer. Queria que seus liderados se alimentassem um pouco
mais, como se este gesto fosse de alguma forma amenizar a sua falha de comando.
Feito isso, passou a lata a Deco, este a pegou, meio atônito, olhou de soslaio
para seu monitor, que já havia voltado à caminhada, também levou a lata aos lábios
avidamente, e, feito isso repassou ao outro jovem e assim sucessivamente, todos
pegaram aquela lata de doce e um a um, levaram a lata aos lábios enquanto
caminhavam em fila indiana. Assim que a lata era passada de um para outro um
sorriso no rosto de cada valente escoteiro aparecia, como se o caudaloso e
precioso doce já tivesse restaurado a força de cada um. Quando o último jovem
devolveu a lata a Deco, seus olhares se cruzaram e um sorriso de cumplicidade
surgiu em seus lábios.
Léo havia
se distanciado um pouco, passos firmes, olhar fixo na trilha. Com passadas
apressadas Deco se emparelhou a ele, tomou suas mãos e olhando fixamente em
seus olhos, nela deixou a lata do doce. Léo nem olhou para a lata, perplexo,
fitou profundamente o leve sorriso no rosto do seu sub... Duas lágrimas saíram
de seus olhos. Nenhuma palavra precisava ser dita. Ao mesmo tempo Cal, ao final
da fileira, começou a puxar uma conhecida canção –”Avançam as patrulhas, ao
longe, ao longe”... – e todos, a plenos pulmões seguiram seu exemplo. Leo,
estarrecido, levou os três dedos a fronte e com os olhos marejados cumprimentou
firmemente seu sub – “Sempre Alerta” – virou-se para sua patrulha, com o peito
estufando de orgulho, sentindo a alegria com que entoavam aquela canção, o
exemplo, à coragem o fez se orgulhar ainda mais do escotismo.
Pegou
aquela lata de doce, limpou as bordas, embrulhou em um saco plástico e colocou
na mochila da patrulha. COMPLETAMENTE
CHEIA... Lembrou-se da sua lei escoteira que dizia – O escoteiro é alegre e
sorri nas dificuldades – fechou a mochila, abriu um largo sorriso, agradeceu a
Deus pelo escotismo e juntamente com sua patrulha, começou a cantar fortemente
seu orgulho de ser escoteiro.