O Comissário, o pistoleiro, o
Delegado, o peixe e tantas lambanças que ficaram no passado.
De volta
com as lambanças. Já contei tantas aqui, porque não mais algumas? Alguns dirão:
Chefe! Isto é uma obra de ficção, hipotético, invenção sua. Outros irão
acreditar. E eu? Fico na minha. Não digo nada. Olhe vivi tantas coisas que de
vez em quando minha mente confunde a verdade da ficção. Afinal foram tantos
anos e como dizem – Eram dois caroços de feijão no passado e hoje dá para fazer
uma feijoada para toda a família. O tempo, só o tempo multiplica o passado.
Risos.
Mais duas
lambanças. Lembranças do passado. E acredite se quiser.
Primeira –
1968. Comissário Regional em Minas. Viajando pelo interior visitando Grupos
Escoteiros. Um convite interessante de uma cidade próxima a Caratinga. Peguei o
noturno da Central do Brasil até Ponte Nova. Lá embarquei no trem misto da
Estrada de Ferro Leopoldina. Ela me levaria até a cidade próxima a Caratinga, onde
deveria ir. Viagem normal. Gostosa. Uma parada em uma estação. Lá fora dezenas
de policiais armados até os dentes. Ninguém na plataforma. Uma voz gritou alto!
– “Zé Neguinho, desça com as mãos para cima! O trem está cheio, desça sem fazer
mal a ninguém”. Ele se levantou da poltrona próxima a minha. Assustado.
Olhou-me.
- Bolinha?
É você? (meu apelido de infância) Incrível, era o Zé Neguinho do Passado. Das
brigas homéricas em Governador Valadares. Briga entre mim e ele. Motivo? Não
sei até hoje. Acho que ambos gostávamos de brigar. Lembrei-me imediatamente.
Dei um sorriso e disse – Zé, de novo? Pensei que tinha morrido cabra da peste!
– Ele riu e disse – Acho que não vou morrer tão cedo. Mandou um passageiro que
estava do meu lado sumir e sentou ao meu lado.
- Sabe a
melhor briga? Disse ele. Foi aquela no morro da Pastoril. Só eu e você. Ninguém
para assistir. Brigamos quase uma hora. Depois você sentou e eu também. Nós
dois “pregados” olho roxo, sangue no nariz. Ficamos olhando um para o outro e
você disse. – Filho da Puta! E eu disse – Filho de uma égua! E caímos na
risada. Essa valeu. Foi a nossa última? Perguntou. - Acho que não respondi. Tivemos
mais uma na Rio Bahia, próximo à ponte do São Raimundo, eu já ia fazer 17 anos.
A voz lá
fora do Delegado foi mais forte – Saia com as mãos para cima e vamos evitar um
tumulto onde podem morrer muita gente! Zé Neguinho gritou – Delegado, espere!
Saio em cinco minutos. E ficou ali comigo a lembrar. Não sei se éramos amigos.
Não sei. Brigávamos pelo menos quatro a seis vezes por mês. Quando passava mais
tempo sentia falta. – Ele apertou minha mão. – Olhe – disse – Você foi o único
Escoteiro que me enfrentou sozinho sem a cambada. E deu grandes risadas.
Levantou me olhou com aqueles olhos esbugalhados que já conhecia, deu uma bela
de uma gargalhada e saiu se entregando a policia.
Segunda –
Acampamento em Derribadinha do Rio Doce. Lá tinha uma pequena gruta. Dava para
ficar a Patrulha. Resolvemos fazer um pesqueiro. Íamos sempre lá. Levei seis
lanches, Romildo mais seis. Éramos só quatro. Dois tinham faltado. Mamãe fez
lindos lanches de pão com carne moída. Colocou gostosos molhos. Comemos todos
até fartar. Mas no dia seguinte deu alguma coisa errada. Comi mais dois
lanches. De calção estávamos a fincar estacas na beira do rio com água na
cintura. Dois foram cortar capim para forrar as estacas no fundo.
Uma dor de
barriga tremenda. Romildo também. Os dois que não comeram não sentiram nada.
Cheguei a rolar no chão de tanta dor. Fui para a gruta. Deitei gemendo. Dormi.
Acordei noite escura, ninguém ali. Só eu. Chegaram quatro homens mal encarados.
Olharam-me e riram. Acenderam uma fogueira. – Vamos assar este menino! – um
disse. Agarraram-me pelas orelhas. Gritei, chamei Romildo, Fumanchú, Israel e
Tonho. Ninguém apareceu para me ajudar. Um medo terrível!
Gritava e
gritava. Berrava de medo. Eles rindo. Romildo gritando – Acorda Vado, acorda!
Acordei suando. Ainda era dia. Um pesadelo. Puta Merda! Parecia verdade.
Terminamos o pesqueiro. À tardinha Tonho pegou um piau que dava mais de dois
quilos. No nosso fogo estrela ele jazia lá, tostando. Peixe frito na brasa. A
noite veio. Barriga cheia. Todos foram dormir. Eu não. Achava que nunca mais
dormiria ali. Risos.
E como
digo no final das minhas histórias,
E quem
quiser que conte outra!
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