Lendas Escoteiras.
A dança da
morte.
(contei esta história uma
vez para uma tropa sênior e guias em uma floresta fechada de eucaliptos quase
as doze badaladas da meia noite. Dizem que nas patrulhas poucos conseguiram
dormir. Eu mesmo quando escrevi fiquei assustado e pensei em não publicar. Mas
como sei que hoje os jovens gostam de uma história de terror eu ainda a conto
por aí. Se são daqueles impressionáveis não leiam).
Desde que nasceu Jove
ouvia falar em Deus. Sua mãe o obrigava a rezar, o padre a confessar, na escola
professoras enchendo sua cabeça de Deus. Sempre quis falar com ele, mas ele
nunca o atendeu. Entrava em igrejas, em templos em busca de Deus. Nada. Ficou
cinco dias no monte Caparal olhando as estrelas procurando um sinal. Nada. Resolveu
ficar jejuando para ver o que Deus faria. Não fez nada. Nando desistiu. Esse
Deus não existia. Se Deus não existe e o diabo? O demônio? O capeta? Ia provar
que ele também não existia. Mas para isso teria que fazer a invocação com a
Dança da Morte. O que iria fazer seria horrível, mas valeria a pena provar que o
inferno não existia. Jove era magrinho, cara de “fuinha” na escola o chamavam
de “porquinho da índia”. Alugou um sitio próximo a cidade. Avisou seus pais que
iria fazer uma viagem de um mês para não se preocuparem.
Ele conhecia Safira,
uma menina magrinha, com treze anos, muda e que morava com a avó próximo a sua
casa. Safira quase nunca saia de casa. Olhos pequenos boca grande, cabelos
escorridos, não tinha nada de belo em sua aparência. Nando a raptou quando ela
ia a padaria comprar pão. Fazia isso toda a manhã. Colocou em seu fusquinha e
partiu para o sitio. Tinha comprado éter e com ele embebido em um lenço viu que
Safira tinha desmaiado. Ao chegar ao sitio, tirou a roupa de Safira, deixou-a
nua. Pequena, magra, apenas treze anos não possuía nenhum atrativo sexual.
Levou-a ao quintal, colocou-a dentro de um tanque de agua fria, amarrou seus
braços abertos em duas estacas fincadas ao lado do tanque com cordas finas. Ela
não tinha como levantar e teria que ficar dentro da água só com a cabeça para
fora. Safira quando acordou estava horrorizada. Abria a boca e só saia
grunhidos. Seus olhinhos saltavam como se fosse fugir. A dor era incrível.
Um horror enorme saia
de seus olhos quando Jove se aproximava. Ele cortou com canivete varias lascas
finas de bambu. A cada hora enfiava uma lasca em uma parte do corpo de Safira.
Sempre ria quando o sangue se misturava a água do tanque. No segundo dia a água
já estava vermelha. Com um pequeno alicate, arrancou a força duas unhas de sua
mão direita. E duas do pé esquerdo. A pobre da Safira gemia horrorizada tentava
gritar um grito que não saia. Desmaiava e acordava. Uma dor tremenda. Não
entendia nada do que estava acontecendo. À noite Jove tirou sua roupa.
Pintou-se de preto. Matou um galo que tinha comprado. Espalhou as penas e o
sangue em cima de Safira que agora estava desmaiada. Daquele jeito Safira iria
morrer no dia seguinte. Não aguentava mais de tanta dor. Jove começou a gritar
a meia noite em ponto. Gritava e dançava, cacarejava e pedia – Apareça demônio!
Mostre sua força! Mostre que você existe! Onde está você demônio dos infernos! E
dava grandes gargalhadas e gritos. Dançou por muito tempo a Dança da Morte.
Estonio acordou
assustado. Dois dias como o mesmo pesadelo. Estonio era investigador de polícia
e também "Chefe" Escoteiro. Adorava sua profissão e ria quando os
meninos e meninas da tropa pediam para ele contar historias de bandidos em
acampamentos ou mesmo na sede. Considerava-se um bom policial. Nunca abusou e
nunca deixou de cumprir suas obrigações dentro da lei. Sempre o mesmo sitio que
ele não conhecia. Uma menina indefesa na mão de um maníaco. Teria que ser
verdade. Isso só podia ser um sinal de Deus. Teria que descobrir onde era o tal
sítio. Sem querer comentou com amigos seu sonho. Estava preocupado. Afinal era
casado também e tinha dois filhos homens. Ainda crianças com dois e três anos.
Rildo o Monitor da Patrulha Leão lembrou que seu pai alugou um sitio para um
homem e que e que só queira o sítio por mês. Pagou adiantado e dobrado.
Junto ao pai de Rildo ele
foi ao sitio. O que viram foi um verdadeiro terror. Nunca imaginaria algum
parecido e olhe, ele era um policial. Tinha visto muitas coisas na sua
profissão. Ainda encontraram Safira com vida. Desmaiada. Toda machucada, mas
respirava. Em volta pedaços de corpo de um homem todo queimado. Tinha sido
esquartejado. Seus membros fedia. Acharam sua cabeça fincada em um bambu. Sua
língua para fora mostrando que morrera gritando e horrorizado. Em todos os
membros cortados, lascas de bambus pontiagudos. Nas duas mãos e nos dois pés
nenhuma unha. Foram todas arrancadas a alicate. Estonio ficou estarrecido.
Depois que a ambulância levou Safira, ele olhou e viu em uma porteira próxima
fumaça como se ela estivesse queimando. Foi até lá. Viu escrito a fogo nas
taboas e o que leu gelou suas veias. Estarrecido imaginou o que poderia ter
acontecido ali. Dizia: – “Não se preocupem. Ele queria me ver, duvidava de mim.
Ele agora vai morar comigo. Lá no meio dos infernos e vai queimar comigo para
sempre” assinado o “Demônio”.
O que viu o que sentiu
mostrou a Estonio que não se pode duvidar da morte, das pessoas, de Deus e do
Demônio. Não soube explicar quando fez seu relatório policial. Não sabia o que
dizer. Escreveu o que viu. Hipóteses somente. Safira se recuperou. Com quinze
anos começou a balbuciar. Aos dezoito já falava normalmente. Sua mente apagou
tudo que tinha acontecido. A dor do passado agora eram alegrias do futuro.
Não sei quantas vezes outros
fizeram a “Dança da Morte”. Espero que não sejam muitos, pois seu final é
trágico.
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