Lendas escoteiras
A fabulosa odisseia da Matilha cinzenta.
((Os personagens -
Tiquinha (Lucilene Bastos), Patropi (Paulo Fernando), Mister Mosca (Joel
Silveira), Neka (Antonia Farisson), Grilo (Jorge Assunção) e Professor (Pedro
Sales))).
- Tiquinha, quando vai terminar as
férias? – demora ainda Patropi demora muito, semana passada você já tinha
perguntado. Mister Mosca era o único que estava plugado na Internet. Neka e
Grilo jogavam paciência e o Professor era o único que estava a escrever em um
caderno. – Todos as terças eles se reuniam em casa de um dos participantes da
Matilha Cinzenta. A alcateia estava em férias. Sempre fora assim em julho. –
Precisamos mudar isto, não dá sem reuniões só porque alguns chefes vão viajar,
disse Neka – Eu concordo com você, sem uma reunião uma excursão ou um
acantonamento e sem escola o tempo não passa! Disse o Grilo. – Olhem, não somos
uma matilha? Afinal na jângal os lobos não se viravam sozinhos? Disse o
Professor. Todos olharam para ele. Fale mais Professor. – Bem acho que podemos
fazer uma atividade de um dia só para nós. Não estamos em férias?
Todos eles pertenciam
a Matilha Cinzenta. Estavam juntos a mais de dois anos exceto a Tiquinha e o
Grilo com um ano. Eram grandes amigos. Sempre as terças se reuniam em casa de
um deles. Hoje estavam na casa do Professor. Dona Filó sua mãe sempre dava uma
olhada no quarto para ver o que estavam fazendo. Agora estava na cozinha
preparando um lanche para eles. Ela gostava de todos da Matilha. Eram seis e
grandes amigos e muito educados. Jovens naquela idade não costumava ser assim.
Mas Dona Filó nunca imaginou o que eles naquele instante estavam planejando. Se
soubesse não estava sorrindo e sim chorando. Não só ela, mas como todas as mães
e pais dos seis loucos e sonhadores lobos da Matilha Cinzenta.
Ficaram ate às sete
da noite quando os demais pais foram buscá-los. O local foi escolhido pela
internet. Um lugarejo antigo, onde existia um trem que aos sábados e domingos
fazia o trecho explorado turisticamente. Na internet viram as fotos. Lindas,
maravilhosas. E a nevoa que encobria com uma bruma cinzenta a cidadela? E
aquela estradinha que levava a riachos de pequenas cascatas com águas
cristalinas? Era demais. Poderiam achar a Pedra do Conselho. Quem sabe o Lobo
Gris estaria lá? Todos estavam com a adrenalina à flor da pele. Discutiram a hora
de saída, hora de chegada, o que deviam levar apetrechos com uma bússola (não
entendiam nada dela) e lanterna. Um lanche extra no caso de demora de retorno.
Como iriam ficar fora o dia inteiro teriam de mentir. Detestavam isto, mas não
tinha saída. - Não dizem que somos todos viajantes do tempo, estagiando nesta
odisseia de uma longa viagem cheia de aventuras, peripécias e eventos
inesperados? Disse o Professor. Concordaram com ele.
Em um gravador com a
voz dentro de um latão de cem litros imitaram a voz do Balu. Ele dizia que
estavam chamando os lobos para uma reunião especial que ia durar o dia inteiro
no sábado. Os pais deviam trazê-los pela manhã e busca-los à tardinha. Levar um
lanche reforçado. Ao receberem o telefonema os pais não duvidaram. Quando
ficaram sós na sede, pois os pais confiavam e os deixavam na porta indo embora
em seguida eles partiram para o ponto de ônibus. – Acho que estou com medo –
disse Neka. – Calma, vais ver que será tão divertido que o sorriso ficará
sempre presente em você e todos nós – disse Patropi. O ônibus os deixaram na
Estação Ferroviária. O trem não demorou. Os passageiros sorriam com aqueles
seis jovens de mochila e uniformizados de azul. A maioria sabia que eram
lobinhos e lobinhas. Ninguém se perguntou onde estavam os chefes.
Quase duas horas de
viagem. Chegaram. A estação era bem antiga. Desceram e subiram uma grande
escada de ferro. Logo em uma passarela enorme tiveram uma bela visão. A cidade
aos seus pés e a bruma cinzenta em volta. O Professor sabia onde deviam ir.
Pesquisou muito. Atravessaram a cidade e ninguém estranhou aqueles jovenzinhos
de azul boné estiloso e mochila as costas sem um adulto. Ninguém se perguntou.
Logo avistaram a estradinha. Linda. Em volta um arvoredo cheio de pássaros e
beija flores coloridos. Estavam em êxtase. Maravilha tudo aquilo. A estrada
diminuiu. Agora era uma trilha. Ninguém queria parar. Cada um se sentia em
plena Jângal. A mente buscava a Akelá ou quem sabe o Balu atrás de alguma
árvore. Nem pensavam em voltar. Todos sonhavam em chegar à Pedra do Conselho.
Sabiam que lá estaria o lobo Gris e seus irmãos. Foi Patropi que disse estar
com fome. Pararam para um lanche. Conversavam entre si cada um fazendo
perguntas que o outro não sabia responder.
Eram duas e meia da
tarde, hora de voltar. Mas e o riacho com cascatas de águas cristalinas? E a
Pedra do Conselho? – Neka que tinha um relógio marcou o tempo. Seguiriam por
meia hora. Se nada encontrassem meia volta. Viram o riacho. Lindo, nada mais
que um banho, pois não foram ali para isto? – Um banho lindo e formidável. Brincavam,
gritavam, riam cada um olhando para o outro e mostrando a alegria de estarem
ali. Esqueceram-se das horas. O sol sumiu. Assustaram-se. Tiquinha pensava como
voltar. – E agora? Perguntou. – Calma, disse o Professor. Todos nós devemos
agir com calma. Vamos aproveitar antes de escurecer e voltar para vermos se
achamos a estrada. O dia se foi. Não enxergavam nada. Tiraram as lanternas.
Mesmo assim não viam nenhuma estrada. Outra trilha e a noite chegou sem lua.
Nem as estrelas eles viam. – Que burrice fizemos? Disse o Mister Mosca – Não
devíamos ter vindo – disse o grilo. Só Patropi e o Professor mantinham a calma.
Eram uma da manhã de domingo. O Professor achou por bem parar. Seguiriam no dia
seguinte. O que os pais iriam dizer ficaria para depois. Agora era dormir um
pouco. A Tiquinha descobriu um isqueiro em sua mochila. Com lanternas juntaram
uns gravetos. A fogueira esquentou a cada um. Os olhos fixos nas chamas que
subiam aos céus.
Acordaram pela manhã com
um Canário Belga cantando e um Bem Ti Vi procurando com seu cantar sua
companheira. Olharam em volta, nenhuma trilha. Tiquinha começou a chorar. Neka
também. Patropi soluçava. Mister Mosca e Professor de olhos fechados não sabiam
o que fazer. Só o Grilo ainda sorria. De que ninguém sabia. – Na sede os pais
desesperados. Policia, bombeiros, O Diretor Técnico, a Akelá, o Balu e vários
Escoteiros falavam ao mesmo tempo. - Onde foram? Ninguém sabia. Fizeram varias
equipes para perguntar na redondeza. Ninguém viu. – Capelão um bêbado do bairro
disse que eles pegaram o ônibus da estação ferroviária. Ninguém acreditou nele.
– Farofa era Monitor da Falcão. Chamou a patrulha. Só vieram cinco. Os demais
estavam de férias viajando. – Vamos achá-los disse. Faremos duplas, uma delas
pegue o ônibus da estação. Tendo alguma noticia ligue para os outros.
O domingo se foi. Nada da
Matilha Cinzenta. À noite ninguém podia fazer nada. Na mata a Matilha não tinha
saído do lugar. Sabiam que estavam sendo procurados. Dividiram os lanches para
dois dias. Muitos saquinhos de biscoitos, batatas palhas e balas. O choro agora
era de todos. Neka segurou na mão de Tiquinha, que pegou na mão de Patropi e
assim todos deram as mãos. Resolveram rezar. – Pai nosso, que estais no céu,
santificado seja o teu nome... Se alguém pudesse ver aqueles seis lobinhos
rezando em plena mata escura também iria chorar junto a eles. Mais um noite em
que dormiram juntos e abraçados. Uma fogueira cujas fagulhas subiam aos céus,
iluminando uma coruja astuta que olhava para eles sem saber o que estava
acontecendo. Dormiram e sonharam com Deus, com Jesus sorrindo para eles e dando
esperanças. Acordaram na segunda feira.
Ninguém apareceu.
Farofa não desistia. Ele
mesmo foi até a estação. Ficou lá mais de quatro horas conversando com um e
outro. Os patrulheiros insistiam em voltar. – Farofa, não adianta, ninguém viu
e ninguém sabe, disse Lumpaza. Mas Farofa não desistia. Risoleta trabalhava na
banca de jornal. Viu os Escoteiros perguntando. Lembrou-se dos lobinhos. –
Foram no trem de sábado para Paranapiacaba. Não vi eles voltarem, pelo menos no
horário que trabalho aqui. – Pronto. Uma pista. Farofa ligou para o Chefe
Trovão. Sabia que ele daria noticia a todos. Sabia que em pouco tempo
Paranapiacaba estaria cheia de bombeiros, policias, a turma de sobrevivência na
selva e helicópteros. – Eu vou no próximo trem disse – Toda a patrulha disse
que agora era questão de honra eles serem os primeiros a encontrarem os cinzentos.
Em Paranapiacaba só um guarda civil lembrou deles. – Pegaram a estradinha da
serra do mar. Farofa conhecia tudo ali com a palma da mão.
No final da estradinha duas
trilhas. Japirú era bom em pistas. Logo viu as pegadas deles. Fácil de seguir.
A Trilha acabou. Matos quebrados. Seguiram em frente. Mais meia hora e lá
estavam eles abraçados e chorando. A fome apertava. Quando viram os Escoteiros
foi um grito de esperança. Um mês depois eles contaram na Alcateia tudo que
aconteceu com eles. Mas não com orgulho e sim como um “mea culpa”. Ninguém
nunca deveria agir como eles. Não leva a nada. Mentiram para os pais, para os
chefes. O lobinho não diz sempre a verdade? E eles não sabiam como agir. Se
adultos se perdem e muitos morrem, eles nunca poderiam ter feito o que fizeram.
Seus pais choraram tanto de alegria que nem brigaram. Mas ficaram de castigos
em casa por três meses. Queira ou não os seis lobos cinzentos da grande
odisseia nunca foram esquecidos. Todos os lobos falavam deles para todo mundo.
Uma fama se criou e até hoje naquele Grupo Escoteiro as historias contadas não
condizem com a realidade. Mas todos tem seus heróis aventureiros. Se fosse para
o bem que seja. Não faria mal a ninguém. Seja sim ou não, que a Matilha
cinzenta aprenda com seus erros.
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